SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DA QUINTA DA REGALEIRA

Raízes da Família Carvalho Monteiro - Lagos da Beira – Parte I
Autoria: Degraconis | CES

1. Capela de São Roque de Lagos da Beira
Um projecto de Luigi Manini e Carvalho Monteiro

Impulsionados pelo interesse que alguns dos participantes do nosso grupo privado do facebook têm vindo a demonstrar no tema, nomeadamente o nosso amigo PA que recentemente visitou Lagos da Beira e ansiosamente aguarda esta nossa divulgação, somos levados a publicar através dos artigos que se seguem, os resultados das pesquisas que encetámos em 2006 em torno das raízes de António Augusto Carvalho Monteiro, as quais, têm sido negligenciadas por toda a literatura que aborda a Quinta da Regaleira e também aspectos biográficos do seu promotor. 

Carvalho Monteiro

Pretendemos então dar a conhecer-vos o que nos foi permitido recolher pessoalmente através do contacto com a população local e, principalmente, as valiosas informações inseridas na obra “Lagos da Beira - Subsídios para a sua história” de Tarquínio Hall, acerca da família Carvalho Monteiro. Apesar de não ter sido uma pesquisa à qual se tenha dado continuação desde essa data, esperamos, no entanto, que estes artigos constituam precioso contributo, quiçá um impulso, para outros que mais laboriosos possam ser na matéria, nomeadamente na confirmação de informações e no rasto de pistas de investigação que possam aqui ser indiciadas pela primeira vez fora dos circuitos de divulgação de Lagos da Beira.

“Lagos da Beira - Subsídios para a sua história” 
de Tarquínio Hall

Ainda antes de entrar no tema propriamente dito, lembramos que pela mesma altura escreveu-se um artigo, publicado no Cethomar, que abordava parte das pesquisas que se vinham desenvolvendo. Trata-se da descoberta de um motivo ornamental inserido no varandim do coro alto da capela da Santíssima Trindade da Regaleira, o qual até à data, e segundo indicações do responsável pela Quinta da Regaleira, não havia sido ainda mencionado. De facto da literatura publicada até à data da sua desocultação da nossa parte não havíamos lhes conhecido qualquer referência a não ser no livro da “Quinta da Regaleira” do Prof. Vitor Manuel Adrião editado em 2007 que lhe dedica algumas palavras. (não sabemos se na edição anterior eventualmente já o referia)

Coro alto da Capela da Regaleira

Os artigos agora publicados não seguem uma linha condutora, apresentando-se como dispersos sobre o tema que gravitará essencialmente sobre as raízes de Carvalho Monteiro em Lagos da Beira (concelho de Oliveira do Hospital), berço de seu pai Francisco Augusto Mendes Monteiro.

Brasão de Lagos da Beira

Do inventário dos prédios urbanos pertencentes à Junta de Freguesia referidos por Tarquínio Hall, sobressai a Capela de S. Miguel que no século XIX estava a cargo da Irmandade de S. Miguel e na qual se faziam os ofícios fúnebres, visto o cemitério ficar-lhe defronte, assim como a Capela de São Roque, sobre a qual nos iremos deter neste capítulo, aproveitando para o efeito as palavras de Tarquínio Hall.

“Da primitiva capela de S. Roque que segundo a tradição oral se situava no largo ou imediações da antiga Praça, pouco se sabe; mas devia ser antiquíssima (séc. XV ou anterior)”

De facto, poucas mais são as informações sobre o assunto e conhecido os incasáveis esforços do historiador Tarquínio Hall para compilar informações sobre Lagos da Beira, é provável não ser tarefa fácil conseguir obter mais documentos ou depoimentos do que aqueles que o mesmo nos deixou na sua obra.

Historiador Tarquínio Hall, autor do "Subsídios.."

Procurámos pesquisar evidências arqueológicas na dita capela que pudessem ainda remontar a épocas  recuadas, mas a capela que no inventário de 6 de Maio de 1870 relativo aos prédios da Junta de Freguesia de Lagos da Beira, parece estar “(…) em sofrível estado material (…) e composta de um altar e sacristia; tem um adro e um campanário com um sino pequeno. Não tem bens” já não existe actualmente, visto Carvalho Monteiro em requerimento apresentado à Câmara Municipal de Oliveira do Hospital em 9 de Julho de 1897 ter solicitado a mudança da dita do local onde se encontrava para onde hoje a podemos ver, e ao qual a Câmara anuiu.


Local onde estaria outrora a primitiva capela de S. Roque e a entrada da
Quinta que havia pertencido à família de Carvalho Monteiro 
Na imagem da dir. pode-se ver a nova Capela que não dista 
muito deste local.

Ficou encarregue desta translação, da capela para novo local, precisamente o cenógrafo-arquitecto Luigi Manini, também autor do projecto da Quinta da Regaleira e do túmulo de Carvalho Monteiro no cemitério dos Prazeres em Lisboa. Aliás foi este o motivo que nos levou até Lagos da Beira em Julho de 2006 (dia 16,17 e 18) com o intuito de conhecer mais uma edificação em que tenham os dois ilustres colaborado. Seria de todo interessante perceber se também neste local se repetiria semelhante simbólica à sobejamente conhecida na Quinta da Regaleira, independentemente do significado que lhe possam atribuir.

Pelos que se pode observar no local e pelas cantarias aplicadas na nova capela, parece tratar-se de um novo projecto, mantendo no entanto o mesmo orago, campanário e o sino pequeno atrás referido no documento do ano de 1870, podendo contudo ter mantido a sua configuração ou tipologia, mas para tal afirmação não temos testemunho nem documento que o corrobore.

Nova capela de S. Roque de Lagos da Beira
 e data inserida no campanário

No interior da capela, talvez o tecto por cima do altar seja a única peça pertencente à antiga capela, e no qual podemos observar um Pelicano alimentar as suas crias, sem dúvida uma representação bastante usual no seio do cristianismo e aqui repetida.

Tecto sobre o altar da capela de S. Roque em Lagos da Beira 
e detalhe do sacrário 

Curiosamente, se pela descrição do ano de 1870 a capela estaria desprovida de bens, no inventário efectuado dois anos depois já constam todos os utensílios necessários à celebração da eucaristia: Cálice de estanho com copa e patena de prata usada, de 687 gramas, Casula de damasco e encarnada, duas alvas com os seus pertences, seis castiçais e Cruz de pau dourado, toalhas de altar muito usadas, dois manustérgios, galheta com o seu prato de estanho, campainha de tocar os santos e Missal antigo, entre outros, objectos dos quais possivelmente ainda não se perdeu o rasto. (também se conserva em Lagos a Beira algum espólio da família Carvalho Monteiro)


Interior da nova capela de S. Roque


O requerimento citado e apresentado à Câmara acerca da capela é referido na acta da sessão de 9 de Julho de 1897 e deixa-nos conhecer bastantes detalhes sobre o assunto, assim como o motivo que o impeliu a tal solicitação, como aliás podem ler no documento seguinte.

Acta da sessão de 9 de Julho de 1897
(carregar na imagem para ampliar)

Somos informados por Tarquínio Hall terem-se iniciado os trabalhos no ano de 1900 e terminado dez anos após, ou seja, em 1910. Porém, e insolitamente, não foi o novo templo entregue em data anterior a 23 de Março de 1919, data em que o presidente da Junta de Freguesia de Lagos da Beira, António Freire de Carvalho Albuquerque, propôs que esta mesma Junta se dirigisse a Carvalho Monteiro com o intuito de pedir-lhe que se dignasse a entregar a capela ao povo. Infelizmente não nos informa Tarquínio Hall da data da efectiva entrega por nada constar sobre o assunto no livro de Actas da Junta. Conhecido o falecimento de Carvalho Monteiro no ano seguinte pode-se ter dado o caso de ter sido o próprio filho a entregar a nova capela.

Porque teria levado tanto tempo – pelo menos nove anos após a sua conclusão - a entregar a Capela à Junta e ao povo? Alias a própria obra em si estendeu-se demasiado no tempo se atendermos tratar-se de uma pequena capela sem complicações construtivas e de simples telhado de telha de quatro águas.

Muitas foram as especulações da parte de quem acompanhou estas nossas pesquisas relativamente à justificação de tanta demora: Carvalho Monteiro e Luigi Manini teriam construído à semelhança da capela da Regaleira uma cripta em piso inferior; Carvalho Monteiro teria alteado o patamar onde se instala a igreja para esconder qualquer coisa, etc.

Escadaria para a Capela, rua Dr. Carvalho Monteiro
 e Rosinhas de Santa Teresinha

Quanto ao que nos foi possível observar não tem qualquer fundamento as ideias enunciadas, visto não se verificar qualquer entrada para um piso inferior, e mesmo estando ocultada, como alias estão as entradas da cripta da igreja matriz construída pelo pai de Carvalho Monteiro nas proximidades, não foi o terreno circundante alteado mas sim rasgado por duas vias que transmitem a errónea sensação de alteamento do solo onde se encontra a capela.

Para terminar este capítulo e porque não voltaremos a falar da Capela de S. Miguel, resta dizer que foi junto a esta que nasceu o novo cemitério local após ter-se deixado de praticar sepultamentos nas proximidades do adro da igreja matriz – o segundo cemitério, havia sido o primeiro na própria igreja e adro – e sendo este em terrenos de Carvalho Monteiro, foi-lhe solicitado precisamente no mesmo ano em que lhe pedem a entrega da nova capela de S. Roque, a cedência de uma faixa de terreno para ampliação do cemitério e ao qual acedeu. Mais tarde, no ano de 1938, volta-se a reiterar-se novo pedido de mais uma faixa de terreno para nova ampliação, desta vez à pessoa de Pedro Carvalho Monteiro, seu filho.

Arruinada Capela de S. Miguel e cemitério

Não é do nosso conhecimento se Francisco Augusto Mendes Monteiro, Comendador da Ordem da Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e pai de Carvalho Monteiro, nascido em Lagos da Beira em 1816 (na sua árvore genealógica até ao séc. XVI todos os seus ascendentes são desta zona) terá pertencido à dita Irmandade de S. Miguel, por falta de documentos que o permitam aquilatar, mas sabemos pelo “Almanak administrativo, mercantil e industrial do Rio de Janeiro” de 1853, ter estado envolvido no Brasil com a “Irmandade e Hospital da Santa Casa da Misericórdia” onde se apresenta como Tesoureiro e domicilio na Rua Direita nº 23, onde segundo nos parece também um dos seus muitos irmãos apresentava residência. (temos ideia de ter documento onde também se verifica ter pertencido a uma Ordem Terceira)


Registo Geral de Mercês, D.Pedro V, liv.8, fl.83
Carta de Comendador da Ordem de Nº Srª da Conceição de Vila Viçosa.

(próximo capítulo: Francisco Augusto Mendes Monteiro)


Agradecimentos: Agradecemos a todos os nos prestaram informações sobre a História de Lagos da Beira, nomeadamente a Junta de Freguesia que apesar de esgotado o livro de Tarquínio Hall nos conseguiu disponibilizar um exemplar, a Vitor Fernandes pela ampla divulgação e trabalho que têm vindo nos últimos anos a desenvolver permitindo hoje (o que não acontecia em 2006) conhecer melhor esta terra, à população local com quem contactámos,  e por último a Sílvia Ferreira que nos permitiu aceder aos locais que pretendíamos conhecer e visitar.  


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